LIONEL ANDELER – MONSIEUR LE GRAPHISTE

22 de novembro de 2014 por keyimaguirejunior

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Key, Lionel, Mari em foto de Vilma Slomp

     O mais espantoso no Lionel não é seu traço ágil, eficiente, claro – é a facilidade com que o produz. Vê-lo desenhando dá uma sensação de que poderia desatarrachar a mão e deixá-la sobre a mesa com papel e tinta – e ir fazer outra coisa. Ao voltar, “a mão” teria produzido dezenas de imagens, todas absolutamente geniais.

Em segundos – e eu disse mesmo segundos, não minutos – saem de seu pincel sereias, sátiros, diabos e anjas, serpentes, gatas, leitoas, astronautas, alienígenas, seres de duas caras, medusas e monstros em geral (“j’aime bien les monstres”).

O primeiro contato com Lionel Andeler foi em sua primeira vinda a este canto do planeta, para uma mostra de arte postal na Sala de Pedra da Fundação Cultural de Curitiba, em 1987. Vestindo uniforme de carteiro, ele entregava no boné um texto referente à mostra… O último contato, foi quando de sua exposição “Cem corações”, na Gibiteca, em 1996. Havia muito mais de cem corações na mostra – mas ele estava usando um trocadilho fonético sem tradução possível: “cent”, 100, tem a mesma pronúncia de “sans”, sem: portanto, “sem coração”, alusão às suas paixões curitibanas.

TATUAGEM (7)

Lionel faz um projeto de tatuagem para uma amiga…

     Entre essas duas exposições, várias visitas – em geral, de surpresa, tipo cair direto de Paris na nossa casa. Durante as quais, produzia aplicações diretas do cartesianismo francês, precariamente aplicado a situações brasileiras. Tipo, ao atravessarmos a rua, eu o apressar:

_ Anda mais depressa, cara, não tem liberdade igualdade fraternidade no trânsito brasileiro!

– Não vão me atropelar, é proibido atropelar gente em qualquer país. E também sou cidadão francês, se me atropelarem, isso significará problemas diplomáticos!

Lionel 10

     Escolher material do Lionel para este post nos meus arquivos, foi uma tarefa árdua. De cartão de visita a cartaz (daqueles franceses, 80 X 120 cm), passando por cartões postais, papel timbrado, envelopes, máscaras, sanfonas, desenhos em todos os formatos e tamanhos – qualquer escolha deixará de lado criações excepcionais.

Lionel tem preferência pelo pincel, mas com qualquer instrumento é capaz de produzir traço obediente a seus desígnios. Mas essa preferência é uma das razões segundo as quais seu traço resiste à mudança de escala sem perda da expressividade. Até mesmo a caligrafia em suas cartas, referencia-se à tradicional apenas como fator de inteligibilidade, cada maiúscula é outra invenção – prá não mencionar a diversidade de composição, de papel suporte, dos borrões, carimbos e o mais que houver.

Mesmo quando paradas, posando, as figuras do Lionel estão se movimentando – correm, saltam, andam, gesticulam, trepam, dançam, se enroscam e se soltam. A maioria das peças de arte postal que recebi ao longo de uns dez anos, fiquei sem entender como acharam o caminho da minha caixa postal – menos por dificuldade na leitura do endereço, sempre manuscrito e em caligrafia inventada, do que por sua beleza – preciosidades para emoldurar e ficar olhando, apreciando, descobrindo sutilezas gráficas de concepção e execução. Quando se acaba de ler uma das quilométricas cartas do Lionel, a gente respira fundo, toma um chazinho e começa de novo…

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      Depois de escrever esse texto, continuo sem saber o que escolher para ilustrá-lo. A maioria das peças de arte postal tem características que dificultam ou impossibilitam o escaneamento. Outros são “fakes” – no sentido de que vieram dentro de envelopes, também desenhados, com selos e carimbos postais criados por ele. Ou trazidos em mãos… Não sei como as “postes françaises” nunca reclamaram de tanta criatividade.

Os impressos, de seu trabalho no Espace Marcel Carné, são, precisamente, impressos – e é bem possível que ele os tenha distribuído às mãos cheias por aí e por aqui.

Fiz umas escolhas aleatórias – resistindo à tentação de usar apenas fotos, a maior parte de minha autoria – das máscaras feitas para a exposição “Cent coeurs”.

Mas fiquem cientes de que é um pálido retrato da exuberância do artista – mesmo pensando numa amostragem de sua atuação em terras brasileiras.

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